quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Ah como eu queria

Para ler ouvindo: Vai morar com o Diabo - Cassia Eller



Ah como eu queria!

Senhor dá-me paciência!
Ah como eu queria, juro que eu queria, queria com todas as minhas forças. Por que, porque tudo seria mais fácil, tranqüilo, sem encheção de saco, em suma uma maravilha, somente eu e mais eu.

Ah, como eu queria!

Vou contar pra mãe!
Paieeeeeeeeeeeeeee!
Não fui eu, foi ele!

Ah como eu odeio esse sorrisinho debochado, em dois segundos eu tiro ele da sua cara fácil fácil. Se preocupa não, se esconde atrás do ombro da mãe, ri o quanto pode, vai ter volta, ah se vai! Tu ainda vai precisar de mim e eu vou estar lá pronto, preparado.

Num briga, num briga uma ova!
Briga sim e briga muito!
Passa 10 minutinhos junto desse ser que tu vai entender muito bem o que estou falando.
Num briga, porque num brigar, isso é papo de mãe.

Senhor pelo um amor de um Deus dá-me paciência!

E se fosse de outro sexo?
Puta ai que ia ser foda mesmo, se já me atormenta por conta de roupa, balada, recado não dado, meu tipo de música, grupo de amigos, imagina se fosse do mesmo sexo ia ser o inferno na Terra. (Muito obrigado meu Deus, dos males os menores)

Mas diga-la, como é que pode?

Mesma mãe, mesmo pai, digamos que a mesma criação (sexos opostos lembra), como podemos ser tão diferentes, será que esse lance de signo funciona de verdade

Será que tu me irrita só porque me conhece tão bem assim, a ponto de só marcar golaços no ângulo, alcançáveis até pro São Marcos? Não, claro que não, deve existir um prazer imensurável nisso, imagino você se contorcendo de alegria ao me ver assim completamente irritado com sua existência.

Ah como eu queria meu senhor! Como eu queria

Mas deixa você, nessa guerra sempre existem artifícios para os dois lados, também te conheço muito bem, sei daquele detalhezinho que posso deixar escapulir sem querer perto de um certo alguém nada importante, sei também deixa eu ver mais o que? Hum sei como colocar algumas pessoas chaves ao meu favor, tu vai ver seu mundinho cair. Ah se vai! E eu vou estar lá sádico gargalhando na tua presença, lembrando de cada dia que tu me pentelhou! Como adoro a vingança.

O ser!
Mas por que eu não moro na China!?

Já penso minha casa meu reino, um quarto só pra mim, nada de empurra ou discussão pra ver quem vai na frente no carro, futebol, vídeo game, vídeo game e futebol, meus canais, o controle integralmente em minhas mãos, transito livre no banheiro, nada de voz estridente, tpms alheias, telefones ocupados. Nada de amigas circulando pela casa.

Opa! Perai! Amiga Phode!
A gostosinha da S, as visitas noturnas da K, as curvas perfeitas da F, aqueles peitinhos da C. Essa é a parte que eu mais gosto!

Caramba! Olha o foco! Olha o foco!
Filho único! Filho único! Filho único!

Mas quem eu vou irritar se ela não estiver aqui, no quarto de quem eu vou ter prazer em peidar, quem vai me ligar pra saber que horas eu chego em casa, que não vai rir das minhas piadas mesmo sendo muito engraçadas!

Caralho!
Foco! Porra!
Único!
Único!

É o que eu mais quero, num quero, quero, quero, quero, quero sim!
Ah Deus, por enquanto dá-me só paciência que com o resto eu me viro

domingo, 17 de agosto de 2008

Para sempre, irmão

trilha: Canção da América - Milton Nascimento


Olá irmão, sei que há muito espera essas palavras minhas e sei também o quanto você precisava ouvi-las a mais tempo. Distanciei-me completamente de você por tantos anos que havia até me esquecido de suas feições. Passamos por tanto juntos. Desde pequeno sempre pude contar com o seu apoio para qualquer situação. Lembra daquela vez que eu estava apanhando do moleque mais forte da rua e você me socorreu? Tomou a surra no meu lugar enquanto eu corria e quando chegou em casa todo machucado, sua primeira reação foi ver se eu estava bem. Até nas nossas próprias brigas, você assumia a culpa e tomava a bronca da mãe sem reclamar, enquanto eu ria escondido atrás da porta.


Apesar de tantas lembranças boas, a que mais me vem à mente é aquela que nos separou. Cego, não percebi as “forças” que atuavam para nos separar de tantas maneiras. Por tantas vezes nos juntamos para ir atrás de alguma mulher e, ironicamente, nos separamos por causa de uma. Hoje é muito mais fácil pra mim pensar nas besteiras que fiz, no rancor que guardei por todos este anos e me arrepender. O ódio tapava meus olhos e eu não percebi o quanto a pobre Sandra te amava. O azar foi ela me conhecer primeiro. Tínhamos um “namorico” até ela te conhecer mais profundamente e ver que era você o par perfeito para ela. Hoje, concordo. Na época saí enfurecido da sua vida.



Ah, quantas foram as suas tentativas de reconciliação. Quantas vezes bateu em minha porta, incansável. Lembro-me até que chegou a escrever uma carta na qual dizia que deixaria Sandra pra me ter de volta como irmão. Li, mas nem me dei ao trabalho de pensar no assunto. Pra mim não importava, meu irmão havia morrido. Depois dessa, você foi desistindo aos poucos. O tempo foi passando, e o meu ressentimento me transformava em uma pessoa terrível por dentro. Eu não ia a nenhum lugar no qual corresse o risco de te encontrar.


Não havia conhecido meus sobrinhos até semana passada. Que jovens... Homens, na concepção da palavra. Lembram muito o pai. Abraçaram-me forte ao me ver, como se já me conhecessem desde a infância. E de fato conheciam. Contaram-me de como você falava de nossas histórias com muita saudade, as vezes com uma lágrima presa no olhar.


Há sete dias acordei bem, como há muito não acontecia. Respirei fundo e não senti a já habitual dor no peito. Logo vi aqueles dois rapazes parados me olhando com afeto. É claro que percebi de quem se tratavam, já que mamãe fazia questão de informar-me das novidades. Desde que essa doença no coração me debilitou, ela vinha todo dia para me ver e pedir permissão para que você me visitasse, é claro que eu não deixava.


Os jovens trataram de contar-me o sofrimento pelo qual você passava desde que soube de minha doença. De como andava calado, cabisbaixo o tempo inteiro. Contaram-me que certo dia à noite você os abraçou forte como se fosse a última vez. E que no dia seguinte acordaram com um estampido muito alto e depararam-se com o corpo do pai deitado no chão da sala. Ao lado, um bilhete, que me entregaram como você queria. Nele você pedia que entendessem sua decisão e que o levassem rapidamente para que pudessem retirar o seu coração e transplantá-lo em mim. Eu estava sedado há dias. Porém, certo dia eu acordei. Como há muito não acontecia. Abri os olhos pela primeira vez em anos.

Só depois de chorar muito entendi. Você assumiu a responsabilidade por um erro meu mais uma vez. Por tanto tempo envenenei meu coração, que ele ficou doente. Você me deu mais uma chance. Hoje entendo perfeitamente e me arrependo profundamente do que aconteceu. Espero ainda poder recuperar um pouco do tempo perdido.


Termino garantindo pra você: seus filhos serão meus filhos, suas alegrias serão minhas alegrias. E sua vida se eternizará na minha. Obrigado, meu irmão. Eu te amo.


Qualquer dia, amigo, a gente vai se encontrar. Seja onde for.

domingo, 10 de agosto de 2008

Sobre irmãos

Para ler ouvindo: U2 - Stay (Faraway, So Close!)

irmaos

Imagine que ser irmão é existir em conjunto. Ser alguém que somente por existir já sente a presença de outro, e tem aquele jeito estranho de gostar.

Como assim?

Lembro-me que uma das descrições de irmandade mais curiosas que eu recebi foi a seguinte:

“Não gosto do meu irmão, não falo com ele ha mais de três anos, mas se um dia eu o encontrar na rua apanhando, vou ajudá-lo, posso até não falar com ele, mas vou ajudá-lo” – Estranho? Acho que não o amor de irmão é muito mais que palavras – perceba que não estou dizendo que o depoimento é coerente.

Imagine que um irmão tem o papel de parceiro, ele é o cara que ensina a empinar pipas, que ensina que rodar peão, que ensina como chegar até a pessoa desejada e por vezes amada.

Irmandade é uma ligação infinita que não se rompe com a distância de continentes ou o (sem virgula entre infinita e irmão) arremesso de travesseiros ou roupas sujas.

Mojica Marins (como Zé do Caixão) diz que só o sangue é eterno – bonito isso, ou não? -.

Imagine que na sétima serie eu tinha um amigo que descobriu ter uma meio-irmã por parte de pai. Sabe o quê ele fez? Na primeira oportunidade que teve, “ficou” com ela. Só depois de muito tempo percebi que expressão era aquela nos olhos dos dois, havia um prazer diferente, uma cumplicidade que nunca mais vi no olhar de nenhum outro casal – e olha que eu só fui saber de Calígula alguns anos depois.

Imagine que o sangue é eterno - Mesmo em casos como estes, onde os sentimentos estão fora de ordem – ao menos na opinião de quem escreve – ser irmão é existir em companhia, é uma amizade desde já consumada e assumida, ou uma cumplicidade, se preferir. Não sei porque os dois primeiros irmãos brigaram, nem como era o ambiente da casa do meu amigo, mas imagino que nada disto fez diferença no sentindo mais simples, são cúmplices, estão unidos.

Imagine o sangue eterno ao que eu me refiro. Não é da placenta, ou do DNA do pai. Quando digo da ligação de sangue entre irmãos, não excluo a ligação dos irmãos de criação, pois sei que, facilmente, um daria o sangue pelo outro (ou um rim talvez). É Disto que estou falando (desta vês sou eu e não o Mojica), o sangue se torna eterno quando o entregamos para o outro.

E os “sem irmãos”?

Francamente não sei definir, é muito mais fácil definir a palavra irmão do que o “filho único”.

E por que vários parágrafos deste texto começam com “imagine”?

Porque a pessoa que escreve este texto é um legítimo filho único.

(Embora considere estes dois amigos do blog como irmãos selecionados).

Mais uma vez este blog me levou onde eu jamais estive.

Revisão: Morena